terça-feira, 30 de junho de 2015

A mágica não dura para sempre...

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Voltar a viver é tão bom. coisas bobas que não fazia há tanto tempo voltaram a fazer parte do meu dia a dia, como ler um livro, assistir um filme... uma das coisas que a depressão me deixou de brinde foi a insônia, algumas noites durmo bem, outras não tão bem e em outras nem durmo, mas não perco mais tempo pensando em coisas negativas, ou me apegando ao que não me faz bem, então nas noites insones, leio, assisto TV, jogo vídeo game, limpo a casa, mas não permito mais que a minha mente seja refém de pensamentos ruins nas minhas noites em claro.

Hoje estou tendo mais uma noite de insônia, então aproveitei para assistir um filme e passar o tempo até o sono decidir vir me fazer companhia, não queria um filme muito profundo que me fizesse pensar muito, queria entretenimento puro, então decidi assistir Cinderela, a versão live action produzida pela Disney, e interpretações a parte o filme entretêm, o elenco é um elenco bom, com Kate Blanchett como a madastra, Helena Bonhan Carter como a fada madrinha e a não tão conhecida Lily James como a inocente Cinderela, já fazem o filme valer a pena, some a isso os efeitos visuais e a fotografia sensacional, pronto, temos um bom filme.

Acredito que todos conheçam a história da Ella, uma jovem que perde a mãe na infância, é criada com muito amor pelo pai, passados anos o pai se casa novamente e a Ella passa a conviver com sua nova madrasta e de brinde duas irmãs, atrapalhadas, egoístas e burras, mas como eu sempre digo, "desgraça pouca é bobagem", em uma viagem a trabalho o pai de Ella morre, e a pobrezinha sofre maus bocados na mão da megera da madrasta, lava, passa, cozinha, e tudo mais que você possa imaginar, com a morte do pai a família ficou sem dinheiro, sem empregados, então a madrasta aproveitou a boa vontade de Ella e a fez de empregada. Que mudança, de filha única do papai à empregada multifuncional, e nem assim Cinderela perde o sorriso no rosto e a bondade dentro dela, confesso que as vezes me dava vontade de entrar dentro da TV,  grudar a Cinderela pelos braços, dar um chacoalhão e dizer "Gata, manda sua madrasta pra puta que pariu", mas com o decorrer do filme comecei a entender que ela não era tão frágil como parecia, e que na verdade o que me incomodava não era a submissão dela à situação, mas sim a paz que ela tinha e a maneira positiva de enxergar as coisas, porque no final das contas foi isso que eu mais gostei no filme, o como a história mostra a importância de se olhar as situações negativas de uma maneira diferente.

O ápice do filme, é quando a madrasta a proíbe de ir ao baile, e a fada madrinha aparece e faz com que o sonho dela se realizasse, e daí tem todo o lance dá carruagem de abóbora, os ratinhos que viram cavalo, e os tão famosos sapatinhos de cristais, e lá se foi Cinderela pro baile, de gata borralheira à princesa, conquistou o princípe, causou inveja nas outras donzelas, virou o centro da festa, mas como avisado pela fada madrinha, a magia não dura pra sempre e pontualmente a meia noite, a carruagem viraria abóbora e tudo voltaria ao que era antes.

Caraca, pensei comigo, é bem isso na vida da gente, a mágica não dura pra sempre, a gente não vai ser o centro das atenções a todo momento, a mágica um dia acaba e é preciso aceitar isso, a realidade, para que o efeito dela, esse sim, tenha um efeito duradouro, aproveitar os momentos mágicos conscientes de que eles acabam e felizes pelas lembranças e lições que nos deixam, sem apego... Cinderela teve que lidar com perdas importantes, mãe, pai, sua história, suas referências, foi tudo tirado dela, por uma madrasta que só pensavam em dinheiro, e de tanto pensar em dinheiro não acumulou o que Ella tinha de mais precioso, experiências que a tornaram uma pessoa mais forte e ao mesmo tempo mais leve. O contraste é muito grande entre as duas, no final das contas a frágil da história era a madrasta, que poderia ter feições fortes, postura imponente, mas tudo aquilo ali era uma casca, pra esconder todos os medos e inseguranças que pouco a pouco vamos percebendo durante o filme.

O resto da história todo mundo conhece, ela sai correndo, perde um pé do seu sapatinho de cristal, a madrinha descobre que ela foi ao baile, o príncipe loucão faz de tudo pra encontrar a Cinderela e sai numa busca meio sem noção, fazendo com que cada donzela do reino tente calçar o sapato de cristal, e quem conseguisse seria a nova rainha, a madrasta sabendo disso tranca a pobre mocinha no sótão, mas como é um conto de fadas, o príncipe encontra a Cinderela, ela calça perfeitamente o sapato de cristal, eles se casam e vivem felizes para sempre. Aposto que eles devem ter tido muitas brigas, muitos momentos difíceis, mas como disse a fada madrinha "A mágica não dura para sempre", mas com certeza tiveram uma vida feliz, com alguns momentos mágicos, mas definitivamente com muitas histórias.

Tiveram dois momentos que me fizeram pensar em algumas. Logo depois da madrasta ter rasgado o vestido da Cinderela e a proibido de ir ao baile, ela corre para o jardim e começa a chorar e relembra do que a mãe dela havia pedido para ela no leito de morte "Seja gentil e tenha coragem", e ela chora dizendo que não tem mais coragem, que não acredita mais em nada, sim, vemos Cinderela na "bad", mas aí aos poucos ela vai criando coragem e mudando um pouco suas atitudes, essa frase é falada muitas vezes durante o filme, e está nela o segredo da paz de Madre Cinderela de Calcutá, gentileza e coragem, ser bom com as pessoas e coragem para aceitar e mudar as situações definitivamente nos erguem, nos fortalecem e mudam nossa vida.

Outro momento do filme que gostei foi quando o príncipe a encontrou no fim do filme, ela trancada no sótão, descabelada, roupas velhas, sem maquiagem... uma imagem bem diferente daquela princesa imponente do baile, mas aquela era ela de verdade, e enquanto ela desce as escadas para encontrar o príncipe, cheia de medos e insegurança quanto a reação e aceitação do príncipe em relação a sua verdadeira imagem temos a narração da fada madrinha que diz "...Quem ela era, quem era de verdade seria o bastante? Desta vez não havia magia para ajudá-la, talvez este seja o maior risco que podemos correr, sermos vistos como somos de verdade..." 

Essas duas cenas me fizeram entender que mesmo que ela nunca encontrasse o príncipe encantado, mesmo que ela continuasse pobre pelo resto dos dias, a Cinderela continuaria sendo feliz, ela continuaria a viver em harmonia consigo, porque ela tinha três premissas de vida, duas que a mãe dela ensinou "Seja gentil e tenha coragem" e a outra que a vida ensinou "Seja você", e a equação foi resolvida, Cinderela era aquele poço de bondade e paz porque ela era gentil, corajosa e principalmente, ela era ela mesmo, e eu vou deitar com essas três metas em minha vida. ser mais gentil, ser mais corajoso e acima de tudo ser mais eu mesmo.

quinta-feira, 18 de junho de 2015

Essa tal felicidade...

Há mais de 2 mil anos Aristóteles já dizia que a felicidade se atinge pelo exercício da virtude e não da posse, tenho pensado muito neste tal "exercício da virtude", o que é exercitar a virtude, quando tenho dúvidas gosto muito de ler o pais dos burros e ler as definições das palavras, no caso da palavra virtude, quando vamos ao dicionário encontramos a seguinte definição: "2.conformidade com o Bem, com a excelência moral ou de conduta etc.; dignidade."

Acho que de toda a definição o que eu mais é "conformidade com o bem", então exercer a virtude é simplesmente ser bom, mais uma vez, a felicidade não está no ter, está no ser. O psicólogo e matemático, Daniel Kahneman, dentre de suas diversas pesquisas onde ele aborda a relação do comportamento humano com o dinheiro, ele chegou a conclusão que há 50 anos atrás, as pessoas de forma geral tinha como ideal de felicidade, estarem casadas, possuírem uma casa própria, um carro na garagem e ao menos um filho estar cursando ou ter passado pela universidade, e hoje passado estes 50 anos, grande parte das pessoas que definiram que os pontos acima eram os pontos essenciais para a felicidade, relataram estarem insatisfeitas e não se sentirem realizadas ou felizes. Está ai a prova científica que a felicidade não está em nenhum bem material, a felicidade não está no ter, ela está no ser, mas ser o que? Somente ser bom é o suficiente? E eu digo não.

Acredito que que o primeiro passo para sermos felizes de fato é entendermos que a felicidade não é uma constante, e como sempre digo, nem poderia ser, afinal o equilíbrio só existe quando existe a oposição, então primeiro temos que entender que intempéries e tristezas vão continuar existindo, vamos continuar passando por momentos difíceis, mas entender que esses momentos difíceis servem para preparar nossa alma para momentos e situações melhores que nos levarão a sermos mais felizes.

Outro ponto importante é vivermos mais o hoje, vivemos num mundo em que somos muito cobrados, somos cobrados a vida toda pelos nossos pais, vamos para a escola e somos cobrados pelos nossos professores, começamos a trabalhar e temos um chefe nos cobrando, casamos e temos um cônjuge que nos cobra, temos filhos e nossos filhos nos cobram, as pessoas vão sempre projetar suas expectativas em nós, elas esperam sempre que sejamos de uma determinada maneira, e nessa constante roda de cobrança muitas vezes acabamos cedendo e tentando sempre nos enquadrar ao modelo perfeito que o outro criou para nós, e passamos a vida toda correndo atrás de um modelo de perfeição que não existe, um modelo de perfeição inatingível. Acho que todos nós se não fazemos isso, já fizemos em alguma parte de nossa vida, acordamos e pensamos: "eu tenho que ser um bom filho", "tenho que ser um bom aluno", "tenho que ser um bom profissional", "tenho que ser um bom namorado(a) ou esposo(a)", "tenho que ser um bom pai" e desse modo vamos nos sufocando nas expectativas dos outros e traçando planos a curto, médio e longo prazo para sermos aquele alguém que alguém projetou para nós, e gastamos nosso tempo nesse esforço insano em sermos melhores custe o que custar, e acabamos nos perdendo nesse emaranhado de "tenho que" e esquecemos que só existe um único "tenho que" que realmente importa, temos que acordar todos os dias, olhar para o espelho e dizer com firmeza para si mesmo que hoje EU TENHO QUE SER FELIZ e só. Quando estamos felizes, isso afeta de forma positiva todas as nossas outras relações.

Nosso maior compromisso não é com o outro, é conosco, nosso maior responsabilidade não é com o futuro, é com o hoje. Parar de projetar as coisas para o futuro é importante, claro que não vamos ser inconsequentes em viver como se não houvesse amanhã, mas precisamos viver mais o hoje, diria que temos que investir 80% do nosso tempo e esforços para ações que veremos os resultados a curto prazo e os outros 20% nos planos a longo prazo. A felicidade não é uma constante, não tem como estarmos bem todos os dias, mas ela tem que deixar de ser uma eterna projeção, algo que sempre está longe, que está sempre em coisas futuras, quando paramos para pensar podemos contabilizar inúmeros motivos que temos no dia de hoje para nos considerarmos pessoas "de sorte", pessoas felizes, se você não conseguir contabilizar no mínimo 05 motivos para ser feliz, procure um terapeuta urgente.

Precisamos nos conhecer melhor, e reconhecer que dentro de cada um de nós existe uma inteligência enorme, simples e natural que sabe exatamente o que fazer e aonde nos levar, algumas vezes esta inteligência se encontra latente, e só precisamos estimulá-la para que ela se desenvolva, é como um músculo, quanto mais você a exercita, mais forte ela se torna. 

Mas como exercitamos essa inteligência? Exercitamos nossa inteligência quando reclamamos menos e agradecemos mais, quando passamos a acolher as coisas que a vida nos dá, sejam elas boas ou ruins, sem bloqueios, sem preconceitos, sem julgamentos, precisamos entender que por trás de cada problema existe uma oportunidade, e essas oportunidades disfarçadas vão nos ajudar a nos conhecermos melhor e este autoconhecimento traz alguns incômodos e inquietudes, mas se aceitarmos e trabalharmos isso, vamos de fato nos amarmos mais, nos aceitarmos e esta aceitação é a via mestra para uma felicidade real.

"Felicidade não é o que acontece nossa vida, mas como nós elaboramos estes acontecimentos. A diferença entre o sábio e o ignorante é que o primeiro sabe aproveitar suas dificuldades para evoluir, enquanto o segundo se sente vítima de seus problemas." - Roberto Shinyashiki

Então decida hoje, decida agora, olhe pra si e diga... EU TENHO QUE SER FELIZ...


sexta-feira, 5 de junho de 2015

Ponto final...

As vezes a vida não é do jeito que queremos, tão pouco do modo que planejamos, não sei se todos são assim, mas eu sou uma pessoa extremamente metódica e sistemática, gosto de tudo detalhado nos mínimos detalhes, gosto de traçar a rota a seguir, acho que porque tenho uma natureza digamos que um "pouco" controladora, gosto de ter as coisas sob meu domínio, definitivamente já fui muito mais controlador e neurótico do que sou hoje, mas ainda tenho muito o que melhorar.
A vida inteira a gente ouve as pessoas falarem que tudo tem um início, meio e fim, acho que no final das contas não gosto muito da palavra fim, sempre tive dificuldade em terminar algumas coisas, em fechar ciclos, em terminar relações, acho que talvez por medo do novo, por medo de lidar com o inesperado, acho que não só medo, mas a sensação de perda de controle das situações, me sinto um pouco menos dono de mim quando o trem sai do trilho, quando as coisas não acontecem da maneira que eu planejei, me frustro quando minhas expectativas não passam de expectativas.

Esse primeiro semestre eu digo que amadureci anos em meses, que aprendi mais sobre em mim alguns meses do que aprendi em 3 décadas, sim 3 décadas, vivendo de maneira controlada, rígida e minimamente planejada. Acho que a vida me ensinou a ser um pouco assim, a cobrar demais, a não desistir nunca, a ir em frente e atropelar tudo que estiver no caminho, inclusive a mim mesmo. Nas minhas sessões de terapia este foi um tema recorrente, minha terapeuta sempre me pergunta "Você sabe qual é o seu limite?" ... hoje eu sei qual é o meu limite, até onde eu posso ir sem fazer mal a mim mesmo. 

Acho que passei a vida inteira me desrespeitando, me mutilando, ultrapassando meus limites, não aceitando a perda, a dor e o fim. Tive momentos bem difíceis na minha vida, uma mãe que amo muito, que me ensinou muito, mas que nunca olhou nos meus olhos e disse um "eu te amo", uma mãe que nunca me deu um abraço, acredito que porque ela nunca teve isso, e quando não temos não temos dar, ela teve uma infância dura, irmã mais velha de mais de 10 irmãos, ela teve de ser mãe, dona de casa, mulher de trabalho, tudo muito cedo, ela tinha que matar muitos leões todos os dias durante sua infância, muitos dragões para construir e manter uma família, mas ela assim como eu tem dificuldade em encarar o fim, e entender que o tempo de lutar e matar seus monstros acabou, ela nunca entendeu que ela podia baixar a guarda, ela não se deu o direito de relaxar, parar e descansar, acho que se ela tivesse a guarda eu hoje seria um pessoa muito diferente do que sou hoje.

Fora isso, minha infância não foi das melhores, ainda criança sofri abuso sexual por um primo 10 anos mais velho do que eu, e isso perdurou por anos, e quando meu pai descobriu, eu ainda fui culpado, apanhei uma única vez do meu pai, não lembro a idade exata que tinha, mas sei que era menos de 6 anos, pois foi antes de estar na pré-escola, acho que foi uma época tão ruim pra mim que não lembro de muitas coisas, minha mente foi tão boa comigo que não lembro das vezes que fui abusado, tenho lampejos somente, mas lembro da reação do meu pai, lembro dele ter dado um soco na minha boca, de eu ter sido lançado contra o armário do meu quarto e lembro do calor do sangue escorrendo pela minha boca, mas não lembro da dor, porque eu acho que mais do que a dor, o que eu senti foi um sentimento de rejeição, é muito duro você se ver sem um porto seguro, você buscar proteção e socorro e não encontrar, isso sim dói, a rejeição não corta, ela dilacera a alma é te quebra em milhões de pedaços que a impressão que se tem é de que você nunca vai juntar esses pedaços.. nunca...

Sei que foi antes dos seis anos, porque quando eu tinha seis anos, minha única referência de amor foi tirada de mim sem compaixão nenhuma, simplesmente sem nenhum prévio aviso, foi assim e pronto, arrancada da minha vida sem pedir licença, minha madrinha tão amada que consigo fechar os olhos e lembrar do sorriso dela, dos abraços, das brincadeiras, se me concentrar um pouco mais consigo até lembrar do cheiro tão bom que ela tinha, minha madrinha tão amada que nem tive a chance de abraçar e dizer "eu te amo" antes dela ir. Mas a vida é assim, nem sempre do modo que queremos, e o câncer veio e a levou de mim, lembro ainda como se fosse hoje quando eu na minha inocência perguntei pra ela o porque ela estava careca, e ela com um sorriso cheio de luz disse que havia pintado os cabelos de rosa e não tinha dado certo e os cabelos haviam caído todos, pensei comigo "uau... que madrinha badass que eu tenho"... e ela virou minha super heroína, mas ela teve que ir embora, mas o amor dela era tão grande que mesmo no leito do hospital ela quis se despedir de mim e pediu pra minha mãe me levar no hospital porque ela sabia que nunca mais iria voltar pra casa, mas não pude entrar por causa da minha idade, e ela pediu pra minha mãe me colocar na calçada de frente com a janela do quarto dela, e foi assim, a última vez que senti o amor na minha infância.

Acho que devido a isso eu sempre busquei aprovação dos meus pais, sempre fiz o meu máximo na esperança de ouvir o tão esperado "eu te amo", ou aquele abraço apertado que via as outras crianças ganharem, eu era uma criança, não entendia das coisas da vida e pensava comigo "se meus amigos aprontam, vão mal na escola e mesmo assim ganham afeto dos seus pais, se eu for melhor do que eles com certeza eu vou também ganhar esse tal de afeto", e assim fiz eu, aprendi a ler e escrever muito antes que qualquer outra criança da minha turma, acho que amo tanto os meus professores e lembro deles com tanta clareza porque eles sempre me elogiavam, eles sempre reconheciam o meu esforço, lembro como se fosse hoje uma professora em uma reunião falando que minha mãe deveria correr atrás para me adiantarem um ano na escola, porque eu já era alfabetizado enquanto outras crianças ainda estavam desenvolvendo a percepção motora e conceitual.  Lembro da minha professora de todos os anos seguintes,  em toda minha formação no ensino fundamental não me lembro o que foi tirar uma nota que fosse diferente de "A" o equivalente ao "10" hoje em dia.

Acho que por essa minha busca desenfreada por afeto e reconhecimento, sempre fui uma criança mais sensível, então imagine só, além de negro, CDF eu ainda era o "viadinho" da turma, então minha infância não foi flores, aprendi desde muito cedo a disfarçar a tristeza com um sorriso amarelo no rosto, aprendi a não demonstrar fraquezas, porque se você demonstra fraqueza as pessoas vão se aproveitar dela uma hora ou outra, aprendi a guardar os meus segredos até de mim mesmo, sempre fui uma pessoa que era amigo de todos, que todos chamavam para brincar, que vinham contar os segredos e pedir conselhos, mas eu nunca encontrei em ninguém esse tipo de pessoa naquela época, me fechei no meu mundinho e ali vivi durante anos, dos meus escombros ergui uma muralha, e assim nasceu e cresceu o meu eu inatingível.

E assim foi durante toda minha adolescência, quando entrei no ensino médio, mudei um pouco meu comportamento, deixei de ser tão sensível e comecei a me expor mais, aprendi a brigar, aprendi a ser mais rebelde, tenho um senso de justiça muito latente, não gosto de ver alguém maltratando outra pessoa, não gosto de injustiça, de discriminação, porque eu sei o quanto isso dói então na adolescência acabei me tornando um rebelde, mas um rebelde com "causa", acabei aos poucos descobrindo minha voz, na verdade acabei descobrindo que eu tinha uma voz e que essa voz podia ser ouvida pelas outras pessoas e que essa voz podia fazer a diferença para alguém, mesmo que fosse pequena, mas ela podia fazer a diferença e quando entrei na minha vida adulta, decidi fazer um trabalho voluntário de 02 anos para a igreja que frequentava. 

Estava decidido, queria dedicar dois anos da minha vida dando aquilo que eu mais queria pra mim, atenção, amor e esperança, então decidi conversar com minha mãe - meu pai nunca foi uma figura muito impositiva dentro de casa - e sabia que a conversa não ia ser das mais agradáveis, porque não estava nos planos dela eu "perder" dois anos da minha vida em um lugar que nem eu mesmo sabia onde iria conversando com estranhos, mas como eu já tinha voz, eu fiz minha voz ser ouvida e mantive minha opinião, como disse no começo, a vida me ensinou a passar por cima das coisas que estão na minha frente e assim foi, alguns meses de preparação e lá estava eu, deixando minha casa e indo rumo ao desconhecido, lembro que quando minha mãe veio se despedir de mim ela não me abraçou, não me disse que me amava, ou coisa do tipo, ela olhou bem fundo nos meus olhos e disse "Você está indo, então não volte antes dos dois anos, vá e fique até o fim... vá com Deus" e foi assim nossa despedida e eu fui.

Foram dois anos sensacionais, convivendo com pessoas diferentes, nacionalidades diferentes, histórias e problemas diferentes, e foi desses dois anos que nasceu em minha uma esperança inabalável nas pessoas, a certeza de que as pessoas mudam e mais do que isso, que elas podem mudar para melhor, nesses dois anos eu vi milagres acontecerem, experiências tão sagradas pra mim que se um dia eu escrever, precisa ser em uma outra ocasião... fiz amigos que trago comigo até hoje, acredito que esses dois anos serviram pra eu deixar de buscar tanto afeto e começar a distribuir mais, talvez minha vocação não seja colher, mas sim plantar, e plantei muito e colho os frutos disso até hoje, e nesses dois anos eu me destaquei, fui o melhor voluntário, o que mais fazia contato com as pessoas, o que mais levava pessoas para a igreja, pelo menos minha busca pela perfeição ajudou nisso, a ajudar outras pessoas, mas os dois se passaram e tive que voltar pra casa, voltei pensando que iria mudar o mundo, mas não mudei, porque mesmo passando por toda essa experiência eu não havia mudado a mim mesmo ainda, e é clichê, mas é a mais pura verdade "o mundo muda, quando você muda". 

Não vou dizer que não mudei, porque mudei muita coisa, mudei o jeito de enxergar o mundo, me tornei uma pessoa mais compassiva, mas como eu disse eu mudei o jeito de enxergar o mundo, mas não havia mudado a maneira de enxergar a mim mesmo, e a gente só muda quando consegue se enxergar, se analisar, se conhecer melhor, e isso eu não tinha feito ainda, iria levar anos até eu começar a me conhecer de fato, porque nesse período ainda continuei a lutar comigo mesmo, porque eu ainda tinha que ser o melhor em tudo.

Depois desse período eu conclui minha primeira faculdade, iniciei uma segunda, me pós graduei, cresci profissionalmente, com muito suor, sempre ansiei por mais, mais conhecimento, mais crescimento, mais dinheiro, mais reconhecimento, afinal eu fui criado para ser o melhor em tudo, pra mim não existia prêmio para o segundo lugar, tudo que fosse diferente do primeiro lugar para mim não me trazia nenhum tipo de motivação ou felicidade, pelo contrário, era um sentimento de frustração de não poder estar no topo do pódium e foi assim, eu tracei um plano pra mim e fui fazendo tudo o que precisava pra chegar lá, de maneira honesta, mas fazia literalmente tudo o que tinha que ser feito, sou um profissional extremamente competente e também competitivo e com isso fui crescendo, e eu fui subindo degrau por degrau, e quando via que não tinha mais para onde subir eu procurava algum outro lugar onde existissem mais degraus, lembro dessa época em que chegava em casa meia-noite da faculdade, dormia por volta da uma da manhã e acordava por volta das quatro, quatro e meia para ir trabalhar, e se alguém me perguntar se eu me arrependo disso, eu respondo "de maneira alguma", porque hoje eu vejo que consegui boa parte do que queria, boa parte do que havia planejado pra mim.

Lembro que logo que comecei a trabalhar minha meta era trabalhar no prédio azul espelhado que existe na rodovia próximo a minha casa, sempre que passava e olhava aquele prédio imponente eu falava pra mim mesmo que iria trabalhar ali, mas não foi assim, fui trabalhar em outra cidade, fui trabalhar no lugar mai imponente do Brasil, no coração da vida financeira deste país, fui trabalhar na Avenida Paulista em uma empresa muito bacana, mas passado alguns anos eu recebo um telefonema de uma agência falando que tinham uma vaga na tal empresa do prédio azul de vidro espelhado, e lá fui eu, fiz a entrevista, passei sem problema algum e comecei a trabalhar, na época não era só o prédio da empresa que era imponente, a empresa em si era uma empresa imponente, crescendo no mercado, se estruturando, com planos e horizontes que faziam os olhos de qualquer profissional brilhar, mas de novo, nem tudo são flores, na época tinha um gerente que se apoiou em mim, ele não era uma pessoa ruim, mas era uma pessoa que não conhecia o que estava fazendo e  tirava mérito do meu trabalho, além de eu fazer o meu trabalho, acabava fazendo o meu o dele e o de outras pessoas do departamento, porque ele passava pra mim, porque confiava na minha execução.

E tudo isso foi dando frutos, tive em um ano três promoções, no ano seguinte mais duas, no terceiro ano fui promovido a coordenador, mas isso teve um preço, estava em frangalhos, em cacos, não tinha uma vida fora da empresa, não suportava mais trabalhar naquele ritmo, olha pro meu gerente e minha vontade era voar no pescoço dele, até que um dia eu cheguei no meu limite e senti que ia entrar em pane, então procurei uma terapeuta e digo que essa minha terapeuta é um anjo, ela me leu e me decifrou, e nesses anos de terapia ela sempre disse que eu precisava sair daquela empresa, que eu precisava respeitar meus limites, que eu estava me mutilando emocionalmente, ela sempre dizia que a minha capacidade de me adaptar à pessoas e situações sempre me ajudou a me manter são e alcançar as coisas que eu queria, mas como tudo na vida, tudo tem um limite e eu não enxergava esse limite e continuei. Meu gerente não aguentou a pressão, as mudanças e a situação ruim que a empresa estava passando e saiu do barco, então sem pensarem duas vezes me colocaram na posição que era dele, mas daí pra frente a empresa mudou, "testaram" diversos diretores para salvarem a empresa para ela não cair do penhasco que estava frente a ela, e a cada novo diretor uma nova cultura, um novo modo de se pensar e de se trabalhar e isso começou a mexer com a minha cabeça, e esse sempre foi um assunto recorrente em minhas sessões, a necessidade de eu sair de lá, eu não tinha mais que provar nada para ninguém, até o ano passado eu já tinha passado por 07 diretorias diferentes e todas elas me conheciam e admiravam meu trabalho, mas na minha sede por mais, ou por meu medo de fechar ciclos eu estava lá, buscando mais, insistindo e persistindo, até que colocaram um diretor que queria que eu fizesse coisas ilícitas, mas como meus valores vem em antes das minhas ambições, minha resposta foi não, e a partir deste não minha vida virou um inferno, humilhações, perseguições e por ai vai.

Mas acho que inconscientemente eu continuei porque sair de lá era como desistir, eu me construi naquele lugar, na minha cabeça aquele era meu território e numa guerra não se abre mão do território, mas quem disse que eu estava em uma guerra? Guerra com quem? Guerra pelo que? Mas antes de eu chegar nessas respostas eu surtei, entrei em depressão, e me afundei, a sensação que eu tinha é de que tudo que eu tinha passado desde a minha infância tinha sido em vão, a sensação que eu tinha era de fracasso, por não ter aguento mais... mas com a ajuda desse meu anjo, hoje eu digo que mudei, porque aprendi muito com essa situação, sofri igual o cão como você pode ler nos textos que escrevi antes desse, pensei que não tinha mais luz no fim do túnel, queria que tudo acabasse, que o caos que era minha vida acabasse, mas graças a Deus não acabou... o que acabou foi um ciclo, o que mudou foi a página, esta história teve um início, um meio e fim e agora o recomeço.

Mas engana-se quem pensa que toda história tem um final feliz, isso só acontece em contos de fadas, as histórias não precisam terminar feliz, as histórias precisam terminar em aprendizado, as histórias precisam terminar, o ciclo se encerra para o começo de um novo e assim que a vida segue, novas histórias, novos tombos, novos passos, novas conquistas, quando encerramos um ciclo, conseguimos olhar mais a fundo nossa vida, conseguimos dar atenção para pontos que antes não conseguíamos enxergar, ou que muitas vezes não queríamos enxergar para não termos "mais um" problema para resolver. Encerrei um ciclo, virei uma página e agora tenho um novo capítulo pela frente.

E a única coisa que eu posso dizer é que o essencial não é vencer sempre, não é ser o número 1 em tudo, não é buscar insanamente por aprovação ou por amor, o essencial é aprender e ser, aprender  com a vitória e com a derrota e ser, mas ser o que? Ser feliz e ponto final.

terça-feira, 2 de junho de 2015

Um brinde a nós... os anormais...

Há uns anos atrás eu escrevi um texto chamado "Cansado desta falsa moral", e hoje acho que não estou mais cansado, estou com medo dessa falsa moral, vejo uma legião de reacionários espalhados pela sociedade, disfarçados sob a fantasia de donas de casas exemplares, bons pais de famílias, homens e mulheres de sucesso, jovens engajados em promover a moral e os bons costumes, encontramos reacionários nas escolas, nas universidades, nas favelas e nas mansões, na política e na religião.

Cuidado, eles estão em todos os cantos, estão a espreita prontos para fazer você engolir a sua pseudo-verdade goela a baixo, sem lhe dar o privilégio de tomar ao menos um copo d'água para ajudar essa "verdade" as vezes indigesta descer... eles falam que a verdade liberta, que essa verdade escrita em um livro milenar, que passou por diversas mãos, que foi adulterado e corrompido, essa verdade tão "pura" liberta, muda e transforma... e aí de você se ousar discordar de tal verdade, aí de você, você vai ser considerado um herege, um anormal, uma abominação, pelo simples fato de não se encaixar na forma da tal verdade libertadora.

Digo que hoje sinto medo da falsa moral, porque hoje eu me senti há centenas de anos atrás na época da inquisição, onde as pessoas não tinham a liberdade de se expressar, se você usava de ervas para cura, era bruxo, se tinha qualquer crença que não fosse o cristianismo, mais especificamente o catolicismo era herege, era condenado por adorar outros deuses, uma mulher se ousasse pensar em qualquer movimento feminista era obra do demônio, e eram queimados vivos, como um aviso aos outros do quão  importante é se encaixar dentro da forma, da equação perfeita que leva a liberdade que é o dogmatismo religioso, carnificina disfarçada de boa ação, torturas em nome de um Deus vingativo e intolerante.

O Deus que acredito é um Deus diferente do que vejo por aí, não é um Deus que mantém seus filhos debaixo de suas asas pelo medo, mas é um Deus que acolhe à todos pelo amor, não é um Deus que julga, é um Deus que liberta, não é um Deus que oprime e humilha é um Deus que apóia e sustenta, minha imagem de Deus não é uma imagem de tirânia, mas sim de bondade, é isso que faz sentido para mim. Respeito a religiosidade das pessoas, ela é a base para muitas pessoas, ela promove caridade, ela realmente opera mudanças significativas nas vidas das pessoas, mas acho que tudo tem um certo limite, tem uma linha muito tênue que separa a espiritualidade do fanatismo.

Teve duas situações hoje que fez com que essa minha revolta aflorasse, primeiro eu olhando a timeline do meu facebook vi um post falando que a boticário estava sofrendo boicote devido à sua campanha do Dias dos Namorados, como não assisto muito à televisão aberta, não tinha visto o tão comentado comercial, cliquei no link e li a matéria e na matéria tinha um vídeo, onde algumas pessoas aleatórias se preparavam para comemorarem o dia dos namorados com seus respectivos namorados(as), e quando eles chegavam na porta dos namorados, conhecemos os casais, um casal hétero, um casal de gays e um casal de lésbicas, que trocam um singelo abraço ao abrirem as portas... um simples abraço... Alguém pode me explicar que mal há nisso? Como esse abraço pode destruir a família brasileira? Alguém me diz... alguém por favor me explica...



Um abraço é mais ofensivo que o preconceito? Um abraço? Comecei a ler os comentários e fiquei me questionando se realmente estamos em 2015, se realmente estamos na era da informação, porque me senti na época dos meus bisavôs onde as pessoas as vezes tinham uma postura retrógrada e reacionária devido a escassez de informação, mas hoje? Hoje não... Eu lembro do comentário falando que o Boticário estava destruindo a família brasileira, outras coisas destroem famílias, mas pode ter certeza que nunca vai ser um abraço. Antes tivéssemos mais abraços dentro dos lares, tenho certeza que teríamos um número menor de pessoas infelizes e mal resolvidas que gastam seu tempo oprimindo e denigrindo ao invés de suportar quem precisa e fazer essa sociedade, melhor em vias de fato.

Depois dessa matéria, rolei mais um pouco a minha barra e "boom", outro post bombástico, Bruce Jenner, um senhor de 65 anos, dois ou três casamentos, filhos e netos, medalhista olímpico, posou para uma capa de uma revista feminina super conceituada - Vanity Fair - e anuncia ao mundo que a partir de agora passa a se chamar Caitlyn Jenner, e Caitlyn estava de maiô, pior que isso, Caitlyn tinha próteses de silicone, e mais, estava maquiada, foi o combo perfeito para a legião de reacionários se manifestarem e exporem a sua "opinião" sobre o assunto: ..."aberração", "...parece um monstro deste jeito", "... isto vai contra às leis de Deus", "... pode fazer o que quiser com o corpo, mas a sua alma é uma alma de homem, está no DNA", "... esse vai direto para o inferno", "... depois de velho vem com essa sem vergonhice"... Mais uma vez os juízes de Deus estão dando seu veredicto, são todos conhecedores das leis de Deus de cabo a rabo, de A a Z, acredito eu que alguns até já tiveram um papo cara a cara com Ele, para afirmarem algumas coisas com tanta veemência.

O mais engraçado, na verdade não é engraçado, mas o mais revoltante é que estes reacionários, dizem que em nenhum momento estão sendo preconceituosos, estão simplesmente expondo sua opinião. Uhum... opinião... e agora é a parte engraçada, se você vai e comenta qualquer coisa que não seja a favor da "opinião" reacionária dessa massa acéfala, você está desrespeitando, está desafiando à Deus... mais uma vez "lobos em pele de cordeiro"... aonde que está escrito isso mesmo? Aaaa na Bíblia, isso mesmo, na Bíblia.

Amo meus amigos religiosos, amo e sou grato à toda a formação religiosa que tive, mas eu nunca vou aceitar alguém usar o nome de Deus para humilhar outra pessoa, fico imaginando como deve ter sido difícil esses 65 anos de Caitlyn, vivendo uma vida que não era dela, décadas e décadas lutando contra seu impulso natural, sustentando uma vida de mentiras, se vendo obrigada a mentir para si mesmo e para as pessoas que ama, mas ela teve coragem de mudar a sua história, de viver de verdade a sua vida e ser quem ela é de fato, ela resolveu ser livre, e eu pergunto: Que mal há nisto? Que mal há em um ser humano querer ser feliz? Ela não está prejudicando ninguém... Na minha cabeça, só consigo chegar à conclusão de que pessoas que gastam seu tempo destruindo outras, devem ter uma vida no mínimo medíocre, e não conseguem suportar um sorriso de felicidade verdadeira, ou um abraço de amor... Deus falou tanto de amor, amar o próximo, respeitar o próximo, estender a mão... mas hoje em dia, grande parte dos religiosos  fazem o contrário, disseminam o ódio e a intolerância em nome dessa falsa moral que envenena nossa sociedade.

Nesse caso da Caitlyn Jenner fiquei muito revoltado, porque eu tenho uma amiga muito querida que é trans, e para mim ela é uma mulher, uma mulher linda, inteligente e honesta e merece ser respeitada como todos merecem, fiquei pensando muito nela antes de escrever este texto e termino ele com uma admiração maior ainda por ela, por ser ela mesma, por não se deixar limitar pelos dogmas da sociedade, por simplesmente ser livre...  Espero estar vivo para ver o ódio e a intolerância darem espaço ao amor e compreensão, e onde as pessoas possam ser de fato livres para serem elas mesmas. 

E um brinde a nós... os anormais...