terça-feira, 2 de junho de 2015

Um brinde a nós... os anormais...

Há uns anos atrás eu escrevi um texto chamado "Cansado desta falsa moral", e hoje acho que não estou mais cansado, estou com medo dessa falsa moral, vejo uma legião de reacionários espalhados pela sociedade, disfarçados sob a fantasia de donas de casas exemplares, bons pais de famílias, homens e mulheres de sucesso, jovens engajados em promover a moral e os bons costumes, encontramos reacionários nas escolas, nas universidades, nas favelas e nas mansões, na política e na religião.

Cuidado, eles estão em todos os cantos, estão a espreita prontos para fazer você engolir a sua pseudo-verdade goela a baixo, sem lhe dar o privilégio de tomar ao menos um copo d'água para ajudar essa "verdade" as vezes indigesta descer... eles falam que a verdade liberta, que essa verdade escrita em um livro milenar, que passou por diversas mãos, que foi adulterado e corrompido, essa verdade tão "pura" liberta, muda e transforma... e aí de você se ousar discordar de tal verdade, aí de você, você vai ser considerado um herege, um anormal, uma abominação, pelo simples fato de não se encaixar na forma da tal verdade libertadora.

Digo que hoje sinto medo da falsa moral, porque hoje eu me senti há centenas de anos atrás na época da inquisição, onde as pessoas não tinham a liberdade de se expressar, se você usava de ervas para cura, era bruxo, se tinha qualquer crença que não fosse o cristianismo, mais especificamente o catolicismo era herege, era condenado por adorar outros deuses, uma mulher se ousasse pensar em qualquer movimento feminista era obra do demônio, e eram queimados vivos, como um aviso aos outros do quão  importante é se encaixar dentro da forma, da equação perfeita que leva a liberdade que é o dogmatismo religioso, carnificina disfarçada de boa ação, torturas em nome de um Deus vingativo e intolerante.

O Deus que acredito é um Deus diferente do que vejo por aí, não é um Deus que mantém seus filhos debaixo de suas asas pelo medo, mas é um Deus que acolhe à todos pelo amor, não é um Deus que julga, é um Deus que liberta, não é um Deus que oprime e humilha é um Deus que apóia e sustenta, minha imagem de Deus não é uma imagem de tirânia, mas sim de bondade, é isso que faz sentido para mim. Respeito a religiosidade das pessoas, ela é a base para muitas pessoas, ela promove caridade, ela realmente opera mudanças significativas nas vidas das pessoas, mas acho que tudo tem um certo limite, tem uma linha muito tênue que separa a espiritualidade do fanatismo.

Teve duas situações hoje que fez com que essa minha revolta aflorasse, primeiro eu olhando a timeline do meu facebook vi um post falando que a boticário estava sofrendo boicote devido à sua campanha do Dias dos Namorados, como não assisto muito à televisão aberta, não tinha visto o tão comentado comercial, cliquei no link e li a matéria e na matéria tinha um vídeo, onde algumas pessoas aleatórias se preparavam para comemorarem o dia dos namorados com seus respectivos namorados(as), e quando eles chegavam na porta dos namorados, conhecemos os casais, um casal hétero, um casal de gays e um casal de lésbicas, que trocam um singelo abraço ao abrirem as portas... um simples abraço... Alguém pode me explicar que mal há nisso? Como esse abraço pode destruir a família brasileira? Alguém me diz... alguém por favor me explica...



Um abraço é mais ofensivo que o preconceito? Um abraço? Comecei a ler os comentários e fiquei me questionando se realmente estamos em 2015, se realmente estamos na era da informação, porque me senti na época dos meus bisavôs onde as pessoas as vezes tinham uma postura retrógrada e reacionária devido a escassez de informação, mas hoje? Hoje não... Eu lembro do comentário falando que o Boticário estava destruindo a família brasileira, outras coisas destroem famílias, mas pode ter certeza que nunca vai ser um abraço. Antes tivéssemos mais abraços dentro dos lares, tenho certeza que teríamos um número menor de pessoas infelizes e mal resolvidas que gastam seu tempo oprimindo e denigrindo ao invés de suportar quem precisa e fazer essa sociedade, melhor em vias de fato.

Depois dessa matéria, rolei mais um pouco a minha barra e "boom", outro post bombástico, Bruce Jenner, um senhor de 65 anos, dois ou três casamentos, filhos e netos, medalhista olímpico, posou para uma capa de uma revista feminina super conceituada - Vanity Fair - e anuncia ao mundo que a partir de agora passa a se chamar Caitlyn Jenner, e Caitlyn estava de maiô, pior que isso, Caitlyn tinha próteses de silicone, e mais, estava maquiada, foi o combo perfeito para a legião de reacionários se manifestarem e exporem a sua "opinião" sobre o assunto: ..."aberração", "...parece um monstro deste jeito", "... isto vai contra às leis de Deus", "... pode fazer o que quiser com o corpo, mas a sua alma é uma alma de homem, está no DNA", "... esse vai direto para o inferno", "... depois de velho vem com essa sem vergonhice"... Mais uma vez os juízes de Deus estão dando seu veredicto, são todos conhecedores das leis de Deus de cabo a rabo, de A a Z, acredito eu que alguns até já tiveram um papo cara a cara com Ele, para afirmarem algumas coisas com tanta veemência.

O mais engraçado, na verdade não é engraçado, mas o mais revoltante é que estes reacionários, dizem que em nenhum momento estão sendo preconceituosos, estão simplesmente expondo sua opinião. Uhum... opinião... e agora é a parte engraçada, se você vai e comenta qualquer coisa que não seja a favor da "opinião" reacionária dessa massa acéfala, você está desrespeitando, está desafiando à Deus... mais uma vez "lobos em pele de cordeiro"... aonde que está escrito isso mesmo? Aaaa na Bíblia, isso mesmo, na Bíblia.

Amo meus amigos religiosos, amo e sou grato à toda a formação religiosa que tive, mas eu nunca vou aceitar alguém usar o nome de Deus para humilhar outra pessoa, fico imaginando como deve ter sido difícil esses 65 anos de Caitlyn, vivendo uma vida que não era dela, décadas e décadas lutando contra seu impulso natural, sustentando uma vida de mentiras, se vendo obrigada a mentir para si mesmo e para as pessoas que ama, mas ela teve coragem de mudar a sua história, de viver de verdade a sua vida e ser quem ela é de fato, ela resolveu ser livre, e eu pergunto: Que mal há nisto? Que mal há em um ser humano querer ser feliz? Ela não está prejudicando ninguém... Na minha cabeça, só consigo chegar à conclusão de que pessoas que gastam seu tempo destruindo outras, devem ter uma vida no mínimo medíocre, e não conseguem suportar um sorriso de felicidade verdadeira, ou um abraço de amor... Deus falou tanto de amor, amar o próximo, respeitar o próximo, estender a mão... mas hoje em dia, grande parte dos religiosos  fazem o contrário, disseminam o ódio e a intolerância em nome dessa falsa moral que envenena nossa sociedade.

Nesse caso da Caitlyn Jenner fiquei muito revoltado, porque eu tenho uma amiga muito querida que é trans, e para mim ela é uma mulher, uma mulher linda, inteligente e honesta e merece ser respeitada como todos merecem, fiquei pensando muito nela antes de escrever este texto e termino ele com uma admiração maior ainda por ela, por ser ela mesma, por não se deixar limitar pelos dogmas da sociedade, por simplesmente ser livre...  Espero estar vivo para ver o ódio e a intolerância darem espaço ao amor e compreensão, e onde as pessoas possam ser de fato livres para serem elas mesmas. 

E um brinde a nós... os anormais...





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