Nas últimas semanas tenho tentado escrever sobre este tema, mas parece que toda vez que começo a escrever, algo me interrompe, talvez seja mera coincidência, ou talvez seja meu inconsciente me sabotando para que eu não entre em confronto e continue fingindo, enganando a mim mesmo dizendo que tudo está bem no meu belo e perfeito mundo azul.
Deixar ir embora... como é difícil deixar ir embora uma parte da nossa história, e quando eu falo deixar ir embora não é simplesmente deixar o físico ir difícil mesmo é deixar partir a história, mostrar a porta de saída para as emoções, para os sentimentos, para as lembranças que aquele partiu deixou, se é que foram deixadas, acredito mais que aprisionamos as lembranças, os sentimentos, como uma forma de manter um pedaço de quem se foi com a gente.
Terminar um relacionamento não é algo fácil, é uma história construída a dois que termina, e o que era vivo vai se tornando uma memória cinzenta, as formas, o cheiro, o toque, o beijo, tudo se torna meras lembranças em nossa mente, e essas lembranças correm, e quando desaceleramos estas lembranças, quando elas passam em câmera lenta em nossa mente, conseguimos entender o porque deixar ir embora é tão doloroso, porque quando fazemos uma releitura das nossas lembranças, nós entendemos o porque nossos olhos brilharam, nosso coração acelerou e porque por um tempo de sua vida você chegou a acredita que aquela seria a pessoa que estaria do seu lado pelo resto de sua vida.
Quando repassamos estas lembranças, entendemos de onde veio o encanto, tudo faz sentido, você consegue identificar o momento exato em que você se apaixonou por aquela pessoa que foi embora, e esta mágica é tão grande que se pudesse você se apaixonaria uma, duas, quantas vezes fossem necessárias por aquela mesma pessoa, mas então você se dá conta que acabou e que tudo agora não passa de lembranças e recordações em uma caixa guardada dentro do armário.
E quando nos damos conta, o sorriso frouxo dá espaço a uma lágrima quase involuntária, e daí o que nos resta é a dor, a dor da perda, a dor da frustração, a dor de deixar ir uma parte de si... Uma certa vez, há muito tempo atrás uma pessoa me contou uma história de um imperador chinês que se apaixonou pelo canto de um rouxinol, e de tanto que aquele canto lhe fazia bem ele pediu para que seus soldados, capturassem e aprisionassem o rouxinol em uma gaiola para que ele pudesse sempre ouvir o canto do rouxinol, mas com o passar do tempo o rouxinol parou de cantar de tanta tristeza por estar preso, e o imperador então soltou o rouxinol para que ele não morresse... Já ouvi e li esta história com diferentes narrativas e finais, mas no final das contas acredito que o que ela quer deixar de ensinamento que deixar ir embora é preciso, manter alguém preso ou se manter preso em um relacionamento onde não existe mais o canto do rouxinol é condenar a si próprio a uma vida de tristeza, e isso não é justo para quem está do nosso lado e principalmente para nós próprios.
Alguns dizem que o tempo cura todas as cicatrizes e ele se encarrega de colocar todas as coisas seus devidos lugares, mas já tentei deixar isso por conta do tempo e hoje vejo que não funcionou, então não basta aceitar o final e deixar ir embora e esperar que o tempo passe e tudo se resolva, que a dor vá embora, desapareça como se nunca tivesse existido. A vida não funciona assim, o tempo só esconde, ele não resolve, não podemos deixar a cargo do tempo uma responsabilidade que é nossa, o tempo acalma o coração para que possamos tomar as decisões mais acertadas, e a decisão correta é deixar ir não só a pessoa, mas deixar ir as lembranças, deixar ir embora os sentimentos que ela deixou, porque enquanto continuarmos apegados a estas lembranças, a estes sentimentos e emoções nunca vamos ter deixado ir embora em definitivo, sempre vai ter um pedaço daquela pessoa em sua vida, vamos viver iludidos que nossa felicidade está condicionada a ela, que só podemos sentir, que só podemos sorrir, que só podemos amar se for aquela pessoa... e nesse jogo de enganar-se a si próprio o tempo vai passando e com ele as oportunidades de sentir tudo aquilo novamente com uma outra pessoa, as oportunidades de fazer com que aquelas lembranças e aqueles sentimentos voltem a acontecer, em um contexto diferente e com possibilidades de desfechos diferentes.
É importante deixar ir embora, para que um novo alguém possa entrar...